Maria Rita Kehl confirma dispensa do Estadão por 'delito de opinião'
Publicado em 07/10/2010, 12:39
Última atualização às 15:15
São Paulo – A psicanalista Maria Rita Kehl confirmou ter sido dispensada pelo jornal O Estado de S. Paulo em decorrência da repercussão na internet de seu artigo "Dois pesos...", publicado no sábado (2). No texto, ela fez uma análise sobre a "desqualificação" dos votos de pessoas mais pobres e comentou a decisão do Estadão de apoiar, em editorial, a candidatura de José Serra (PSDB) à Presidência. Ela foi comunicada da decisão na quarta-feira (6).
Em entrevista ao jornalista Bob Fernandes, para o Terra Magazine, Maria Rita confirmou a informação sobre sua demissão. "Fui demitida pelo jornal O Estado de S.Paulo pelo que consideraram um 'delito de opinião'", explicou. Desde o início da semana, circulava o boato de que ela só poderia escrever em sua coluna a respeito de temas afeitos a sua área, sem tocar em questões políticas.
Desde fevereiro deste ano, a psicanalista de 58 anos escrevia quinzenalmente no caderno de cultura do jornal (Caderno 2). Ao assumir o posto, ela declarou ao jornal que só tocaria em assuntos relacionados à profissão "quando não tiver assunto, mesmo".
Segundo a psicanalista, sua demissão se justificou a partir de uma análise de seu comportamento. "O argumento é que eles estavam examinando o comportamento, as reações ao que escrevi e escrevia, e que, por causa da repercussão (na internet), a situação se tornou intolerável, insustentável, não me lembro bem que expressão usaram", disse.
Ela acredita que o cenário eleitoral influenciou diretamente na decisão do jornal. "Isso se agravou com a eleição, pois, pelo que eles me alegaram agora, já havia descontentamento com minhas análises, minhas opiniões políticas", afirmou.
Ricardo Gandour, diretor de Jornalismo do Estadão, em declaração dada ao portal Comunique-se, disse que a transição de colunistas é um processo natural. "O jornal tem 92 colunistas. Em todo caso, este ano saíram três e entraram outros três, sempre entra e sai, essa transição é normal", declarou, não confirmando se a repercussão do artigo definiu a saída de Maria Rita.
A psicanalista criticou o fato de a imprensa acusar o governo Lula de censura e cerceamento à liberdade de expressão ao mesmo tempo em que dispensa uma colunista por divergência de opinião. Ela lembrou que as empresas de comunicação têm "interesses econômicos" e "partidários".
Ela não acredita que o governo Lula tenha demonstrado intenções de censura à mídia. "Eu não conheço nenhuma medida, nenhuma ação concreta, nunca ouvi falar de nenhuma ação concreta para cercear a imprensa", assinalou.